segunda-feira, 1 de abril de 2013

Branca de Neve - Parte I


Era uma vez, em um reino muito distante e em um tempo remoto, uma jovem que vivia em um castelo de pedras cobertas por limo e trepadeiras. Suas torres se elevavam tanto, que pareciam tocar o céu e perfurar as nuvens. De longe via-se suas janelas e seu imenso portão de madeira, que também era uma ponte para atravessar o fosso. Um jardim imenso se estendia por vários hectares de terra  repleta de flores e frutos que beiravam um caminho de lajotas que levavam ao portão do castelo. Os aldeões, apesar de pobres, eram felizes pois não lhes faltava comida e abrigo.

Apesar de toda a placidez daquele lugar, de tempos em tempos uma jovem desaparecia misteriosamente. Os aldeões diziam que um espírito maligno de uma mulher corcunda e decrépita, que usava uma capa cinza raptava estas jovem e as matava para beber o sangue. Os aldeões diziam que era um espírito invejoso que buscava, no sangue das jovens, absorver sua beleza e reviver sua juventude há muito perdida.
O castelo era habitado por uma rainha belíssima e sua jovem enteada, igualmente bela, que era filha legítima do rei mas que ainda não havia assumido o trono.  A rainha possuía cabelos dourados, os olhos negros e a boca ornada por um batom em um tom de marrom. Os cabelos, puxados e presos atrás em forma de coque, eram lustrosos e muito bem aninhados sob a coroa dourada. Sabia-se que ela era uma curandeira mas isto era encarado com normalidade por todos. A jovem, de cabelos escuros e boca naturalmente vermelha, possuía a pele muito alva e, portanto, fora apelidada de Branca de Neve. Apesar de conviverem no mesmo castelo todos os dias, a relação entre elas era fria como a própria neve. Conversavam pouco.

Para os que viveram o suficiente, era estranho o fato de que a rainha nunca envelhecia e jamais ganhara um vinco sequer em seu rosto liso como o mármore. No entanto, para os súditos ela estava ali sob os poderes de Deus e, talvez, Ele a tenha dado o dom da imortalidade. De fato, era uma rainha relativamente boa: ostentava todo o luxo a que tinha direito, mas o povo não passava fome. A jovem princesa podia passear tranquilamente pelas vilas sem sofrer nenhum tipo de ameaça. Era adorada  e também desejada, pois seu corpo era...voluptuoso...por assim dizer. Vários e vários pretendentes lhe ofereciam todo o tipo de presentes, mas ela sempre recusava. Não obstante a idade, a rainha também era cortejada por muitos reis de outros lugares. Ela nunca aceitava ou cogitava a ideia de se casar novamente, mas adorava ser cortejada e bajulada por todos aqueles nobres.

A rainha tinha o costume de consultar seu espelho mágico, afim de verificar se era a mulher mais bela do reino. Todas as manhãs, após o desjejum, ela colocava-se ante o espelho e pegava uma agulha dourada com a qual perfurava o dedo. Aquela preciosa gota de sangue que brotava de seu dedo era esfregada no espelho e assim o espírito que nele estava preso, era invocado e respondia as perguntas feitas pela rainha.

- Espelho, há alguém, neste reino, mais bela do que eu?
-  Não. És a mais bela mulher em todo o reino – esta era a resposta de todas as manhãs. Entretanto, certa manhã, a rainha ouviu a resposta que a deixou furiosa:
- Espelho, há alguém, neste reino, mais bela do que eu?
- És a segunda mais bela. A primeira é sua tão estimada enteada, Branca de Neve. Ela é a mais bela de todo o reino e também é a mais desejada. – A rainha, tomada por inveja e fúria, lançou sua taça de vinho contra a parede e naquele mesmo instante começou a arquitetar um plano para se livrar da jovem de pele alva que lhe roubara o posto de mais bela.

A rainha caminhou pelos jardins do castelo em busca da fruta mais vistosa e apetitosa que pudesse encontrar. Lá avistou uma maçã aparentemente apetitosa e de um vermelho vivo. Estendeu sua mão para apanhá-la, ignorando a serpente peçonhenta que se encontrava no mesmo galho em que a maçã. A bela monarca regressou ao seu quarto e, utilizando seu sangue e conjuros diversos, amaldiçoou aquela maçã. Através de um feitiço, mudou sua forma para parecer um jovem gentio inocente e assim partiu para a vila que ficava próxima ao castelo, onde Branca de Neve costumava passear para ver os produtos diversos expostos por aldeões comerciantes. Ao poente do Sol, finalmente ela avistou sua enteada, que caminhava lentamente por entre as pequenas tendas que vendiam ânforas, frutas, pães, tecidos e animais.

- Boa tarde, jovem princesa! – ela saudou a sempre bela Branca de Neve.
- Boa tarde, meu jovem!
- Perdoe a minha abordagem imprópria, mas tenho aqui algumas maçãs frescas para vender. Sei que há muitas delas em seu jardim real, porém minha família está em dificuldades e preciso vender tudo o que puder ou não teremos sequer o que jantar esta noite.
- Eu estava mesmo querendo uma maçã! – Branca de Neve disse, com a bondade que lhe era habitual – Uma moeda de ouro é o suficiente para pagar por este cesto de maçã?
- Uma moeda de ouro, minha senhora?! Isto é o suficiente para pagar pelo cesto de maçã e até mesmo para comprar a mim!
- Não seja tolo! – Ela tapou a boca com delicadeza ao sorrir.
- Minha senhora, sei que minha casa não é digna, mas gostaria que conhecesse a minha família para que eles testemunhem toda a magnanimidade e benevolência de nossa jovem soberana.
- Você é muito bem educado e fala muito bem para um camponês. – Ah, um deslize gigantesco cometido pela rainha incógnita. Branca de Neve era boa, mas não era estúpida.
- Ao caminhar tanto como eu, ouve-se nobres conversando e aprende-se muito desta forma, minha senhora.
- Ora, além de muito cortês, é também muito astuto! –  Pela reação da jovem princesa, a desculpa havia funcionado bem. – Eu vou acompanhá-lo até a sua casa, mas não posso me deter por muito tempo, pois devo voltar para o castelo.
- Não tomarei muito de seu tempo, minha senhora. – O jovem curvou-se em sinal de respeito. Os dois caminharam em direção à casa do jovem e, neste percurso, Branca de Neve olhava com intensidade para o jovem camponês que a acompanhava.




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