quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Sem Resposta


Passei pelos gradis de ferro, com inscrições sagradas em latim. Uma igreja com ar barroco e tão familiar a mim mesmo. Uma mulher vestida de negro, tão linda com seus cabelos ondulados, segurava uma criança nos braços. O padre, de cabelos brancos e longos mas de aparência jovem com seus óculos redondos, parecia discutir com a mulher.

- Eles conseguiram, padre! Eles reencarnaram! Os fantasmas conseguiram reencarnar HAHAHAHAHAHA!
- N-Não é possível... - seus olhos arregalados e a voz presa pelo medo - Você está mentindo, bruxa!
- Olhe a marca das bruxas, padre! Olhe no pescoço desta menina!
- Por Deus... não! Deus tenha misericórdia desta criança e piedade de nós... - ele pôs a mão sobre a boca, os olhos opacos e repletos de pavor, como se o bebê fosse o próprio diabo. Outros vários espíritos perambulavam o interior da igreja escura, como se fossem pequenas névoas.

Eu pude ver os olhos da criança envolta em uma manta branca. As pupilas dilatadas e uma faixa estreita de íris vermelha... aquilo me apavorou mas... a criança tinha um sorriso tão lindo! Ela não poderia ser má. Eu não entendia o motivo do padre tratar aquele renascimento - ou nascimento, depende do ponto de vista - como uma desgraça ou como algo satânico. Na verdade, aquele duelo de fé não me interessava.

A bruxa deixou a criança sobre o altar da igreja, enquanto o padre se colocava de joelhos, com o rosto entre as mãos, chorando e rezando pelo bebê. A mulher parece não ter notado a minha presença... ou simplesmente a ignorou e saiu voando pela porta.

Corri o quanto pude, mas ela havia desaparecido. Eu não percebi antes, mas enquanto tudo isto acontecia, uma festa havia sido encerrada na cidade e toda a população se dirigia à igreja para rezar pelos parentes falecidos. Como eu a encontraria agora? Havia sabe-se lá quantas bruxas crianças e mulheres, que se agrupavam e falavam incessantemente, parecendo um bando de gralhas irritantes. Eu precisava encontrar aquela bruxa... mas estava difícil, então segui a multidão que se dirigia ao chafariz da igreja. As crianças lá se reuniram e começaram a correr e gritar, enchendo-se de doces que haviam ganhado.

- Ele tem a língua muito grande! Quase me sufoquei quando o beijei alí atrás da capela. - dizia uma linda garotinha loira. O que diabos há com essas crianças? Acho que isso me chocou mais do que aquela criança... mais pela forma como a garota disse do que pelo beijo em si.

Deixei todo aquele tumulto e segui por uma pequena rua formada de pedras toscas que levavam para a saída da igreja. A mulher... a bruxa... era ela! Linda, tão linda em um longo vestido vermelho de mangas curtas, com o cabelo caindo pelo rosto e os lábios igualmente vermelhos.

- Por que fugiu de mim? - eu disse, com lágrimas nos olhos. Ela me olhou de volta, sem expressão alguma no rosto.

Abaixei os olhos e quando os ergui novamente, ela já não estava mais lá. Como ela fazia isso? Novamente eu segui pelo caminho das pedras, com o rosto molhado. Eu nem mesmo sei o motivo das lágrimas e de todo aquele desespero... toda aquela vontade de encontrá-la. Um grande salgueiro centenário se expandia por todos os lados, com seus galhos pendendo para baixo e suas folhas em forma de ramos se espalhando por um grande diâmetro.

Acho que uma criança desesperada tomou conta do meu corpo e, ao passar pela árvore, arranquei um punhado de suas folhas... um tipo de buquê sem flor alguma. Permaneci em pé, estático sob a copa da árvore secular, ainda chorando sem saber o motivo. Olhei para cima e, por entre as folhas, vi a sombra dela, sentada em sua vassoura. Ela usava um chapéu triangular.

- Procurava por mim?
- Por que fugiu de mim? - ela desceu da vassoura e ficou parada em pé, na minha frente.
- HAHAHAHAHAHAHA - Ela somente riu. Não uma risada de sarcasmo ou desprezo, mas como se perguntasse a si mesma o motivo do meu desespero, estranhando tudo aquilo. Eu, com um tipo de fúria que nem eu mesmo sei explicar, joguei as folhas na cara daquela mulher.
- Matt...! - Ela, surpresa, somente disse o meu nome e não conseguiu dizer mais nada. Mas o seu olhar... o seu olhar estático, surpreso e triste... ele me dizia tudo. Seus olhos me perguntaram "por quê?".
- Eu...

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