quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O Barco



Muito boa noite, meus amigos que se mantém despertos sob a luz da Lua que jaz lá no alto. Não vim para falar de Lenora e tampouco para atormentar-lhes a alma, a mente ou ainda para atacar alguma carcaça jogada ao chão... pelo menos, não agora.

Há, neste mundo, pessoas que são controladoras... quase obsessivas. É óbvio que não se deve deixar que tudo corra ao acaso, mas também não se deve crer que tenhamos controle absoluto sobre algo ou alguém, pois isto não é uma verdade. O universo tem sua própria mecânica e sua própria lei... seu próprio tempo. Tudo isso se faz notar através de uma história de alguém que, desbravando a si próprio, descobriu algo valioso.

Este jovem vivia em uma região fértil, onde colhia os frutos mais suculentos, comia da carne mais tenra e bebia da água mais fresca. Nunca negou que sua vida era boa e que, mesmo tendo que se submeter à vontade dos pais, não podia reclamar de nada. No entanto, o homem é sempre impelido a ir para frente e, a não ser que crie raízes no solo do medo e da comodidade, há sempre de partir em direção a algum lugar. Posto que sua vida não lhe fazia plenamente feliz, o tal jovem começou a sonhar com novos horizontes.
Dizendo aos pais sobre tais anseios, estes lhe responderam: "Vá em frente! Deve tentar para não se arrepender." Oras, com este encorajamento, quem não haveria de se arriscar? O jovem lançou-se para além dos limites até então conhecidos, mas sempre regressando ao lar com uma pedra preciosa diferente que encontrava pelo caminho.

Devo mencionar que, como quase todo mundo, aquele jovem tinha uma galáxia nos olhos. Entretanto, diferente da maioria, a galáxia em seus olhos parecia sempre em expansão e ele desejava sempre mais. Mais longe, mais "ego", mais do desconhecido, mais descobertas... e isto o fechou em si mesmo. Era como se uma arca guardasse a si própria - algo que muitos que lerão esta história, jamais compreenderão.

A cada distância percorrida e a cada terreno desbravado, o jovem conseguia encontrar uma pedra preciosa, um obstáculo e uma ferida... mas a sua motivação para seguir era grande. Ao regressar para casa, encontrava sempre uma reprimenda sucedida por um sorriso. Em sua mente, não compreendia como podia reprimir algo que antes apoiavam.
Em uma de suas caminhadas as margens de um rio caudaloso, descobriu sua foz e pela primeira vez na vida, vislumbrou o grande horizonte que pairava logo acima do mar tão vasto. Voltou para casa animado e contou a descoberta aos pais. Disse-lhes que faria um barco e o ornaria com suas pedras preciosas, para então, desbravar o horizonte. Seguiu-se uma séria de repúdios e vozes contra a sua vontade.

Apesar do respeito e do amor que tinha pelos pais, ele amava mais a si e a sua vontade. Fez um barco e o batizou de "Vida", Ali, em sua casa, apesar da preocupação de todos, novamente recebera estímulos. No entanto, a cada alvorecer, o barco que fora tão trabalhado aparecia com algum reparo por fazer e o impedia de zarpar. Ora, ele sempre fora um jovem tranquilo. Nunca passara por problema algum e o universo parecia empurrá-lo e convidá-lo ao desconhecido e às dificuldades que a vastidão oferece. Ele ouvira, do bico de um pássaro, que um vulto sabotava seu barco durante a noite, no intuito de impedir sua partida.

Pois em uma noite clara, ele desfraldou as velas de seu barco, lançando-o ao mar e partiu. Pela primeira vez, assumiu o leme e seguiu mar adentro, indo de encontro ao horizonte. Ele nunca sabia quando o vento ia soprar, mas sabia que chegaria a algum lugar. Com um nó na garganta, ele escreveu estas linhas:

" Não há nada que possa exprimir a minha gratidão por tudo o que me foi dado. Não há nada que pague o amor incondicional. Porém, não há nada nestes sentimentos que implicite amarras e serventia.
Parti, com o MEU barco simples e confiável, em direção ao novo pois o que me dão, não mais me basta. Aceitem, ainda que a contragosto ou de coração partido, a minha decisão. Ou repudiem intensamente até que não haja nem mais o aperto no peito e que minha figura ingrata esvaneça. Mas acima de tudo, perguntem-se a respeito da minha felicidade e da minha motivação... da minha decisão.
Se eu estiver feliz, fiquem também felizes ou simplesmente aceitem o que foi decidido. Se não puderem, lamento por terem de viver uma dor desnecessária, enquanto vivo a minha felicidade."


O barco, chamado tão propriamente de "Vida", adentrou o horizonte. Onde ele está? Não sei, mas certamente encontrou um porto adequado. Não a felicidade dos contos de fadas, pois esta não existe sob aquela forma, mas a felicidade do dia a dia. Ainda que se tenha o controle do leme, não se sabe quando o vento vai soprar e quando o barco, novamente, irá partir.

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